Melhor Filme
Mommy
Mr. Turner
National Gallery
Plemya
Cinco extraordinários
filmes, bastante distintos entre si. Um deles, um documentário observacional
sobre a mais famosa galeria de arte em Londres, uma brilhante reflexão sobre o
consumo e apreciação de arte numa cultura e economia contemporânea. Outro, uma
exaltação do amor maternal, um melodrama formalmente ambicioso e a explodir de
energia.
Apesar do meu usual ódio
por filmes biográficos, aqui aparece um exemplo desses mesmos filmes, a
biografia de William Turner tornada pintura quase impressionista ao retratar momentos
soltos de uma vida, capturados com uma beleza magistral.
Mas se a história do
cinema avança com a inovação, então Plemya
e Ma'a al-Fidda, são as grandes gemas
desta seleção. O filme ucraniano olha a violência numa sociedade pós-soviética
e os jogos de controlo, poder e violência que nesse mundo são jogados, nunca
permitindo a audiência perceber completamente o filme ao não legendar a
linguagem gestual ucraniana. Um filme que coloca o ser humano no centro em todo
o seu fascínio e horrível fealdade. Mas o grande milagre do cinema no passado
ano foi, para mim, o documentário sobre o estado atual da Síria construído a
partir de vídeos postados na net e de filmagens trocadas por e-mail entre os dois
criadores do filme. Uma obra para uma era da internet, um grito de angústia por
uma nação em verdadeiro apocalipse, um poema sobre a humanidade desde o milagre
do nascimento ao horror que o Homem cria sobre si mesmo. Um filme
verdadeiramente inovador, comovente e indispensável.
Melhor Realizador
Wiam Bedirxan e Osama Mohamed por
Ma'a
al-Fidda
Xavier Dolan por Mommy
Bruno Dumont por P’tit
Quinquin
Mike Leigh por Mr. Turner
Miroslav Slaboshpitsky por Plemya
Bedirxn
e Mohamed trazem ao seu filme tanto uma fúria e coragem poucas vezes vistas no panorama
do cinema contemporâneo, assim como uma melancolia lírica sobre o estado da
Humanidade atual. Retratam uma realidade coletiva a partir das suas perspetivas
individuais e fazem algo de extraordinário, um grito em forma de filme.
Também rico em gritos
é o trabalho de Dolan, que com este filme parece chegar à final maturação do
seu estilo, brincando com o formalismo da sua obra e levando o género do melodrama
ao cinema contemporâneo com uma energia e ferocidade impossíveis de negar.
Dumont cria um dos
mais bizarros filmes do ano passado, misturando a tragédia inerente ao policial
sobre um serial killer e misturando isso
com algum do mais estranho humor que já vi em cinema. Por detrás de todas as visões
ridículas e faces grotescas, existe no entanto uma pulsante humanidade no seu
filme, algo que apesar de vislumbrado na sua obra passada nunca esteve tão maravilhosamente
exposto como aqui.
Leigh adapta o seu
estilo à biografia, virando as costas às estruturas dramáticas do género e
filmando o seu filme como pedaços de uma vida, colecionados num retrato, numa pintura
em forma de filme. A sua perspicácia para o trabalho de atores junta-se a um
absoluto domínio estético e artístico sobre a sua obra e protagonista.
Finalmente,
Slaboshpitsky eleva o seu filme a mais que uma simples experiência, usando o
som, planos sequência e uma distanciação e tom glacial, para criar um dos mais
perturbadores filmes dos últimos tempos. A barreira de comunicação força a audiência
a olhar os humanos, examinar os seus comportamentos e observar à distância a sua
crueldade e semelhança consigo próprios.
Melhor
Atriz Principal
Marion Cotillard em Deux Jours, Une Nuit
Anne Dorval em Mommy
Julianne Moore em Maps to the Stars
Julianne Moore em Still Alice
Melisa Sözen em Kis
Uykusu
Julianne Moore domina
esta lista com duas menções, duas interpretações que exploram dois caminhos
antagónicos na carreira da atriz. Num filme vemos uma implosão progressiva do
indivíduo abordado de forma naturalista e não forçosamente dramática. No outro
vemos uma grotesca criação, brilhante na sua estilização bizarra e perturbante,
perfeita para a sátira em que se inclui. Ambos os filmes têm a atriz como a sua
salvação e em ambos os casos o génio da sua interpretação consegue elevar as
obras.
As restantes atrizes
encontram-se em filmes mais ambiciosos e bem-sucedidos. Sözen encontra nas sequências
prolongadas de Ceylan, uma presença melancólica avassaladora. Olhar para os
seus olhos é quase doloroso em certas partes do filme, especialmente quando em
cena com o protagonista masculino.
Dorval pega na
histeria melodramática de Mommy e
grita, chora e sofre, sem deixar a sua criação cair na caricatura. No final é a
sua escolha dolorosa e esperança desesperada que transparecem e ficam com a audiência.
Cotillard, a minha
favorita desta seleção, tem sobre os seus ombros todo o seu filme, sendo que a
estrutura repetitiva e invariável foco na sua personagem, fazem de Cotillard um
estudo naturalista de depressão, desespero e perseverança na situação económica
da Europa atual. Nas suas mãos o ato de andar de autocarro e beber uma garrafa
de água torna-se um dos mais belos momentos capturados pela câmara dos irmãos
Dardenne.
Melhor
Ator Principal
Haluk Bilginer em Kis Uykusu
Ralph Fiennes em Grand Budapest Hotel
Jake Gyllenhaal em Nightcrawler
Timothy Spall em Mr. Turner
Channing Tatum em Foxcatcher
Com
a única comédia desta seleção, Fiennes oferece a mais deliciosa confeção da sua
carreira, criando no protagonista do filme de Wes Anderson, um homem que parece
emergir do próprio requinte do seu ambiente. Um sonho meio ridículo de uma era
pomposa e elegante que apenas vive na nostalgia do passado, Fiennes é uma joia
cómica.
Bastante longe de
tais frivolidades adocicadas temos Gyllenhaal, qual inseto em forma humana, com
olhos arregalados e tiques grotescos. Um predador insaciável e assustador,
tanto na sua atitude formidável como na banalidade da sua aparência e ambição,
Gyllenhaal consegue imbuir o seu psicopata com algo levemente infantil e
curioso sem perder o desconforto constante da sua presença vampiresca.
Bilginer é o centro
egotista, egocêntrico e casualmente cruel do seu filme. As suas atitudes e
confusão são a perfeita personificação da incapacidade humana de entender o
outro ser humano. As cenas de diálogo prolongadas com o resto do elenco são
particularmente louváveis, especialmente no que diz respeito à sua constante
atitude de superioridade intelectual, moral e aristocrática.
Spall e Tatum veem-se
com a tarefa de interpretar figuras verídicas, ambos explorando brilhantemente
a sua fisicalidade. Mas enquanto Tatum é uma besta bruta e quase primitiva na
sua inocência e simplicidade, Spall encontra em Turner um poço de infindáveis
contradições. Um artista e um animal, um homem delicado e um bruto abrasivo, uma
figura grotesca e voraz e um velho melancólico, uma criação sem igual tanto na
carreira do ator como do realizador que o guia aqui.
Melhor
Atriz Secundária
Patricia Arquette em Boyhood
Jessica Chastain em A Most Violent Year
Suzanne Clément em Mommy
Rene Russo em Nightcrawler
Kristen Stewart em Clouds of Sils Maria
Arquette e Stewart dominam esta lista com um naturalismo relaxado
que em ambos os filmes funciona como uma brisa de ar fresco. Stewart é uma
quebra maravilhosa nas explorações cliché e forçosamente intelectuais do seu
filme, parecendo existir noutra realidade do resto do seu elenco, sendo que
quando desaparece perto do final do filme, é impossível a obra recuperar da sua
ausência. Arquette evolui ao longo dos anos, evitando o melodrama fácil em que
poderia ter caído e que não tem lugar neste filme, Talvez o melhor mesmo seja a
sua aspereza e humor que nunca deixam a figura maternal tornar-se numa ideia
distante, ou numa anotação passageira na vida do filho e na estrutura do filme.
Clément, pelo
contrário, envolve-se no melodrama de Mommy,
emergindo com, talvez, a mais reticente das suas contribuições para a
filmografia de Dolan. A sua gaguez e comportamentos bizarros conjugam-se com
uma quietude surpreendente e falta de afetação, que faz da sua presença algo
essencial para o delicado balanço do seu filme.
Russo e Chastain,
ambas interpretam figuras formidáveis tanto na sua aparência de uma beleza
glacial, assim como no seu jogo de perceções e fachadas. Russo vai nadando
entre poder e vulnerabilidade, deixando sempre uma sobra constante de
voracidade curiosa transparecer. Chastain, pelo contrário, apresenta uma
fachada digna de uma Michelle Pfeiffer, aquando de Scarface, mas vai dando vislumbres de alguém que aparenta muito
mais controlo e frieza do que realmente possui.
Melhor
Ator Secundário
Buddy Durress em Heaven Knows What
Ethan Hawke em Boyhood
Peyman Moaadi em Camp X-Ray
Mark Ruffalo em Foxcatcher
Andrew Scott em Pride
Admito
que Moaadi possa quase ser considerado um protagonista no seu filme, mas é o
modo como este suporta e informa as atitudes da personagem de Kristen Stewart
que realmente mostram o seu génio. Existe uma facilidade e falta de afetação no
seu trabalho que conseguem evitar os clichés de filmes semelhantes, nunca
fazendo do prisioneiro que interpreta uma figura santificada ou idealizada,
deixando sempre uma arrogância e inteligência se mostrarem por entre os seus
comportamentos, mesmo nos seus momentos mais agressivos e vulneráveis.
Hawke e Ruffalo são
particularmente brilhantes no modo como recusam o dramatismo dos seus papéis,
encontrando-se em ambos os casos uma aparente falta de esforço por parte dos
atores. Num caso, o humor fácil e progressivo cansaço e maturidade são
impressionantes, tornando uma figura paternal em alguém que parece amadurecer,
tentando ao mesmo tempo manter a aparência de despreocupação e charme de uma
juventude passada. Ruffalo como a vítima central ao enredo do seu filme é uma
tempestade silenciosa de amor filial e resignação feroz. Sendo que os seus
melhores momentos são a sua comunicação extremamente física e tátil com o irmão
e a desconfortável entrevista sobre o seu futuro assassino.
Durress interpreta o
que aparenta ser uma versão de si próprio, com uma facilidade assombrosa. Mais
que os protagonistas na sua autocriada tragédia romântica, é a presença apática
e casualmente desesperada de Durress que torna o mundo do filme uma experiência
quase tátil e enervante. Por fim, Scott oferece uma visão de anos de mágoas e rejeições
sob uma constante fachada de simpatia misturada com uma ligeira melancolia. Os seus
rasgos de contentamento e nostalgia aquando da sua primeira visita à comunidade
mineira são particularmente comoventes.
Melhor Argumento Original
Roy Andersson por En duva satt på en gren och
funderade på tillvaron
Stephen Beresford por Pride
Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne por Deux
Jours, Une Nuit
Bruno Dumont por P’tit
Quinquin
Michel Rejtman por Dos
Disparos
Beresford consegue miraculosamente
pegar na fórmula da história inspiradora verídica e criar um retrato de duas
comunidades, recusando usuais narrativas heroicas e individualistas e criando
uma maravilhosa teia de personagens eximiamente definidas e desenvolvidas, sem
nunca descurar no que diz respeito à leveza e gentileza da sua comédia mesclada
de amargura social.
Com uma estrutura
repetitiva, os irmãos Dardenne oferecem aqui, aquele que, para mim, é o seu
melhor texto. Uma exploração ao mesmo tempo de uma figura a combater a sombra
da depressão, assim como um retrato da economia Europeia e seu esquecimento dos
humanos nela envolvidos.
Mas são as três
comédias negras nesta seleção, que realmente me prendem a atenção. Andersson
encerra a sua trilogia com esta maravilhosa obra de segmentos interligados onde
o desconforto e a condição humana são tornadas bizarra e muitas vezes
absurdista comédia. Dumont cria uma trama que tanto é uma comédia, como um
policial bizarro e uma tragédia humanista. Finalmente, Rejtman traz uma
estranha apatia ao seu filme, onde o comportamento humano é algo quase incompreensível
e estranhamente cómico. As ligações entre os vários membros do elenco lembram
os filmes mosaico de Iñarritu, mas a negação do dramatismo, o humor negro e a
apatia avassaladora, fazem do filme uma experiencia invulgar e tão divertida
como friamente alienante.
Melhor Argumento Adaptado
Andrew Bovell por A Most Wanted Man baseado no livro de John Le Carré
Jez Butterworth, John-Henry Butterworth e Christopher
McQuarrie por Edge of Tomorrow baseado no
livro All You Need Is Kill de Hiroshi
Sakurazaka
Ebru Ceylan e Nuri Bilge Ceylan
por Kis
Uykusu baseado em
contos de Anto Checkov
Gillian Flynn por Gone
Girl baseado no seu livro
Antoine Lacomblez e David
Oelhoffen por Loin des Hommes baseado no conto
L'Hôte de Albert Camus
Edge of Tomorrow talvez pareça ser uma estranha escolha, mas com o
seu domínio exímio da lógica de um videojogo e seus jogos de ritmo e repetição,
o filme consegue tornar-se um dos mais inteligentes filmes de ação dos últimos anos,
sem descurar no que diz respeito ao entretenimento ou mesmo ao humor.
Loin des Hommes adapta Camus eximiamente, expandindo um conto
existencialista num western marcado
por explorações morais e políticas.
A partir de Checkov,
o filme de Ceylan encontra na sua adaptação para o inverno turco, um apelo à
empatia, assim como uma sofredora reflexão sobre a impossibilidade de um ser
humano perceber o outro. Tudo isto, conseguido a partir de magistrais diálogos,
que apesar do seu tamanho não perdem a atenção do seu público.
Bovell segue o classicismo e elegância de
Carré na sua história de amoralidade, espionagem e jogos políticos.
Flynn adapta a sua
própria obra numa brilhante exploração pós-moderna no próprio género do
policial assim como da natureza do casamento, pelo caminho criando um dos
filmes mais fervorosamente discutidos do ano passado.
Melhor Montagem
Xavier Dolan por Mommy
Jean Luc Godard por Adieux au Language 3D
James Herbert e Laura Jennings por Edge
of Tomorrow
Julio Perez IV por It Follows
Frederick Wiseman por National Gallery
Mommy demonstra o mesmo tipo de ritmo
dos filmes passados de Dolan, sendo exuberante e errático, mas parando por
vezes em momentos sublimes, deixando as sequências musicais respirar. O seu
trabalho na sequência da fantasia da protagonista sobre o futuro do filho é
particularmente impressionante, criando uma visão confusa e fragmentada como
uma memória meio esquecido de um futuro imaginado.
Godard também mostra
uma energia formidável no seu último filme, criando uma mescla caótica de imagens
e encontrando um humor refrescante por entre os seus usuais pretensiosismos. O
autor envelhecido parece encontrar gozo nos lugares mais estranhos sem nunca
perder o seu lado aventureiro no que diz respeito a forma e estrutura. Um
momento em que combina dois movimentos de câmara opostos no mesmo plano em
simultâneo é, talvez, o melhor uso de 3D na história do cinema, completamente
apoiado na montagem e ritmo das imagens.
Edge of Tomorrow aplica ritmos cómicos a alguma da melhor montagem
de filme de ação do cinema recente. Há um ritmo fervoroso e enervante no filme,
que marca ainda mais estrondosamente as ocasiões em que a montagem parece
relaxar e deixar a audiência respirar e repousar. A sua qualidade repetitiva é
particularmente bem acompanhada pela montagem.
Numa semelhante
mistura de comédia com tensão vem It
Follows, uma magistral mescla de tensão conseguida a partir da suspensão
dos momentos e planos, com uma certa ligeireza ritmada que cria uma falsa
segurança e permite o lado humorístico do filme brilhar. A montagem é
impossível de separar do efeito geral deste brilhante filme de terror.
Como é possível pegar
num ano de filmagens das atividades de um museu, fazer um filme com três horas,
e conseguir que não haja um momento morto em toda a longa-metragem? Não tenho
bem a certeza, mas Wiseman consegue-o sem nunca mostrar nada de vistoso.
Montagem discreta e esplendorosamente eficaz. Há uma beleza estranha em tal
elegância cinematográfica, aqui alcançada pela mão precisa de um dos grandes
autores de documentários.
Melhor Fotografia
Fabrice Aragno
por Adieux
au Language 3D
Jingsong Dong por Bai ri yan huo
Dick Pope por Mr. Turner
André Turpin por Mommy
Bradford Young por A Most Violent Year
Jingsong Dong por Bai ri yan huo
Dick Pope por Mr. Turner
André Turpin por Mommy
Bradford Young por A Most Violent Year
Adieux
à Language e Bai ri yan huo são,
desta seleção, os filmes que mais riscos tomam com o uso da cor. No filme
francês, as câmaras digitais de pouca qualidade fazem do filme uma miragem
alucinante de cores ora ácidas e violentas, ora desleixadas e deliberadamente
feias, envoltas no melhor uso de 3D que já vi. Enquanto no noir chinês,
Jingsong Dong foge à tradição do género e substitui as sombras expressionistas
e monocromáticos por um mundo inequivocamente urbano inundado por luzes
artificias em todas as direções. O noir é trazido tanto à contemporaneidade como
a uma nova cultura, e a um novo visual. O seu trabalho nas cenas noturnas é
particularmente excitante, tornando a sujidade e degradação urbana num sonho
multicolorido.
Mommy não é só
visionário na sua composição pouco ortodoxa. Mas também é fantástico na criação
de um mundo profundamente belo, cheio de luzes suaves e matizes douradas que
fazem o filme parecer um companheiro da obra passada de Douglas Sirk. O uso de shallow focus e desfoque deliberado são
particularmente belos, especialmente na coleção de magníficos momentos musicais
que pontuam o filme.
Também A Most Violent Year parece existir numa
luz amarelada da nostalgia, mas aqui não se trata tanto da nostalgia do indivíduo
como da nostalgia de uma cidade. Nova Iorque é transportada para a sua aparência
nos filmes da década de 70, rica em sombras e doentiamente amarelada, como se o
mundo oscilasse entre a beleza nostálgica e a podridão social, mesmo no que diz
respeito à sua aparência.
E finalmente, Dick
Pope alcança algo de divino em Mr Turner,
pintando com a luz o mundo de Turner e fazendo de cada plano do seu filme uma
pintura viva. É o mais belo de todos estes filmes, mas a sua beleza não é uma
simples futilidade, mostrando o mundo pelos olhos do seu protagonista e
encontrando beleza e harmonia tanto numa paisagem marítima como nas texturas
rudes de uma casa podre de onde varejeiras mortas caem do teto.
Melhor Cenografia
Suzie Davies e Charlotte Watts por Mr. Turner
Alex Holmes e Jennifer Drake por The Babadook
Sebastian T. Krawinkel e Yesim Zolan por A Most Wanted Man
Adam Stockhausen e Anna Pinnock por Grand Budapest Hotel
Katia Wyszkop por Saint Laurent
Alex Holmes e Jennifer Drake por The Babadook
Sebastian T. Krawinkel e Yesim Zolan por A Most Wanted Man
Adam Stockhausen e Anna Pinnock por Grand Budapest Hotel
Katia Wyszkop por Saint Laurent
Mr. Turner e Saint Laurent ocupam-se ambos de criar
mundos físicos a partir da detalhada reprodução histórica. Na biografia do
pintor existe uma natureza quase tátil aos cenários, os materiais rudes quase
que se cheiram através do ecrã. Não é um trabalho cenográfico particularmente
atraente oscilando entre rigidez vitoriana e a decadência dos interiores do
atelier de Turner, mas existe nele uma beleza estranha e imperdível.
No caso do filme
sobre Yves Saint Laurent, o estilo e a beleza estética estão acima de tudo e
tudo contaminam. Mesmo as ruas despidas da capital francesa parecem ter sido cuidadosamente
escolhidas para um editorial de moda, sendo que os cenários transpiram sempre
de beleza e sofisticação. Não há um passo em falso, desde a opulência do
apartamento do protagonista até a um teto de uma discoteca coberto de néons
multicoloridos.
Num diferente tipo de
decadência, A Most Wanted Man expõe uma Alemanha contemporânea assombrada pelas
sombras do passado. A modernidade fria mescla-se com a escuridão criminosa do
passado do país. Um ambiente apropriado a este thriller, que parece sufocar a
audiência assim que se olha o mundo friamente decadente e apodrecido do filme.
Mas qualquer
desconforto visual desses outros filmes não se compara ao horror proporcionada
por The Babadook. Desde a casa com a
sua pintura escura e ameaçadora ao livro de desenhos que deve ser um dos
melhores adereços já criados nos anais do cinema de terror, há algo de
profundamente genial em todo o design. Horrendo, mas genial.
Cabe, no entanto, ao
filme de Wes Anderson tomar as mais altas honras. Mais nenhum filme tanto
dependeu da sua cenografia e mais nenhum atingiu tais píncaros. As detalhadas e
obsessivamente complexas visões do realizador são aqui exacerbadas a um
ambiente rico em artifício e elegância. Mas uma elegância sempre cortada por um
profundo sentimento de ridículo. Não há aqui nada de natural, neste mundo que
vomita requinte ao mesmo tempo que parece ser tão frágil e efémero como os
bolos que vão aparecendo pelo filme. Se há maneira de criar comédia a partir do
espaço e da decoração, então aqui temos o seu maior exemplo.
Melhores Figurinos
Milena Canonero por Grand Budapest Hotel
Jacqueline Durran por Mr. Turner
Jacqueline Durran por Mr. Turner
Christian Gasc e Valérie Ranchoux por Madame Bovary
Anaïs Romand por Saint Laurent
Ami Sow por Timbuktu
Nas
mãos de Canonero, as figuras do filme de Wes Anderson parecem converter-se em requintados
cartoons. As cores são quase ácidas
na sua intensidade, e a demarcação de vilania a partir do vestuário é
perfeitamente ridícula. A elegância da Europa de outrora filtrada pela demente
sensibilidade de Anderson e da sua figurinista. O uso de padrões tirados das
pinturas de Klimt no guarda-roupa de Tilda Swinton é particularmente
maravilhoso.
Mr. Turner e Madame Bovary
tratam de épocas semelhantes, se bem que em nações diferentes, mostrando visões
bastante diferentes sobre a questão do figurino de época. Jacqueline Durran
aposta na textura, no detalhe e na rudeza dos figurinos, criando uma visão tão
cimentada num suposto realismo como no impressionismo da pintura de Turner. A
figurinista pode estar presa à reprodução de época, mas as suas criações não
deixam de ser impressionantes e essenciais a criação de todo o maravilhoso
visual do filme.
Fugindo a esse nível
de autenticidade temos os figurinistas de Madame
Bovary, que vestem a sua protagonista em cores ácidas e desconfortáveis,
tornando-a quase que num inseto gigante face ao resto das figuras do filme.
Emma Bovary flutua sobre o filme como um fantasma multicolorido, e silhuetas e
cortes pouco práticos mas inegavelmente vistosos. As brincadeiras com os níveis
de estilização entre Emma e o resto do elenco são especialmente louváveis.
Em Saint Laurent udo
gira à volta das roupas, sendo que o filme nos oferece tanto uma coletânea de
reproduções de desenhos de Saint Laurent, assim como um mundo elegante em todas
direções, até os mais distantes figurantes estão vestidos como que saídos de
uma passerelle parisiense. Se em Mr.
Turner, o trabalho de Dick Pope expunha o olhar do protagonista, aqui o
mesmo é feito pelos figurinos de Ami Snow. O casaco branco de Louis Garrel
aquando da sua introdução é particularmente memorável, como que brilhando
lascivamente por entre a escuridão sedutora de um clube noturno.
Em Timbuktu tais exuberâncias estilísticas
não existem, mas não é por isso que os figurinos são de menor relevo. Num filme
que se desenrola à volta de conflitos sociais e religiosos, a importância da
indumentária é inegável, criando códigos visuais que tanto podem condenar como
salvar as figuras do filme. O uso da cor é de salientar, criando pinceladas de
cores ricas na paisagem desértica que envolve a ação do filme.
Melhor Caracterização
Christine Blundell por Mr.
Turner
Frances Hannon e Mark Coulier por Grand Budapest Hotel
Frances Hannon e Mark Coulier por Grand Budapest Hotel
Gigi Williams e Miia Kovero por Inherent Vice
Elizabeth Yianni-Georgiou e David White por Guardians of the Galaxy
Charlotte Arguillère, Nathalie Tabareau, Laure Talazac e Aude Thomas por
Saint
Laurent
Destes cinco
filmes, o blockbuster da Marvel é, sem dúvida, aquele com a mais exuberante
maquilhagem, criando uma coleção de bizarras criações. A maquilhagem de Karen
Gillan é particularmente impressionante. Não é particularmente subtil, mas
subtileza não seria apropriada a tal filme.
Mr. Turner e Inherent Vice recriam épocas díspares com o mesmo tipo de cuidado,
nunca temendo cair no grotesco ou levemente ridículo. Em Vice isso ainda á mais exacerbado para suportar a comédia do filme,
exagerando o look dos anos 70 sem perder uma pátina de verossimilhança. Turner é particularmente louvável no
modo como mostra a degradação ao longo dos anos, quer seja pelo envelhecimento,
quer seja na progressiva doença de pele da sua criada.
Grand
Budapest Hotel e Saint Laurent
tentam recriar mundos de elegância e estilo. O filme de Wes Anderson tenta
encontrar comédia nessas criações, fazendo como os figurinos e elevando as suas
figuras a cartoons vivos. Para além
disso, ainda temos algumas maquilhagens mais complexas como a transformação de
Tilda Swinton numa milionária envelhecida. A caracterização do filme francês
continua o que a cenografia e figurinos já fazem e ajuda a criar um mundo que
parece existir como um contínuo editorial para uma revista de moda. Algumas das
escolhas mais interessantes incluem os membros tatuados das festas de Yves e
Jacques, como o homem com o desenho de um fato tatuado no corpo.
Dawn of the Planet of the Apes
Godzilla
Guardians of the Galaxy
Interstellar
X-Men: Days of Future Past
Godzilla
Guardians of the Galaxy
Interstellar
X-Men: Days of Future Past
A categoria dos blockbusters dos grandes
estúdios, como os filmes da Marvel. Um deles desenvolvendo os poderes e efeitos
vistos em filmes passados enquanto encontra novas ideias visuais como uma cena
em câmara lenta para o mutante Quicksilver, ou os portais convocados pela
personagem de Fan Bingbing. O outro mostra a criação de personagens fantásticas
como Groot e Rocket, que conseguem ser mais interessantes e carismáticos que
muitos dos seus parceiros de cena humanos. Também a beleza reminiscente de comic books conseguida com alguns dos planos
ricos em CGI lembra as possibilidades mais ambiciosas deste tipo de efeitos.
Quando falamos na criação de personagens
digitais também temos Dawn of the Planet
of the Apes, em que a tecnologia de motion
capture continua a avançar, criando um elenco de símios digitais tão ou
mais convincente que o elenco de carne e osso.
Godzilla trabalha sobre outro tipo de animal.
Ao invés dos protagonistas de Dawn e Rocket de Guardians, há pouco de humanoide
nas bestas monumentais deste filme, O peso e perceção de monumentalidade que os
efeitos conseguem transmitir é impressionante, tornando os monstros digitais em
presenças esmagadoramente físicas dentro do seu filme.
Interstellar é, talvez, o filme com as técnicas
menos ortodoxas, usando projeção de ambientes gerados por computador e
mecanismos complexos para criar o movimento dos robots do filme. Os ambientes
apesar de impressionantes e imersivos, parecem por vezes pecar pela falta de
originalidade, o que talvez seja mais culpa da cenografia, mas a maravilha
técnica dos efeitos visuais do filme é dificilmente negada.
Faris Badwan e Rachel Zeffira por The Duke of Burgundy
Alexandre Desplat por Grand Budapest Hotel
Alex Ebert por A Most Violent Year
Rich Vreeland por It Follows
Hans Zimmer por Interstellar
Alexandre Desplat por Grand Budapest Hotel
Alex Ebert por A Most Violent Year
Rich Vreeland por It Follows
Hans Zimmer por Interstellar
The Duke of Burgundy e It Follows inspiram-se no cinema de
terror dos anos 70. Duke vai buscar
inspirações ao cinema italiano de outrora, criando um ambiente sonoro hipnótico
e sedutor, enquanto It Follows
inspira-se claramente no trabalho de John Carpenter, criando momentos de
maravilhosa tensão, obtendo ao mesmo tempo um certo romantismo musical.
Desplat continua a sua colaboração com Wes
Anderson, obtendo aqui uma das suas melhores composições. O charme europeu e o
absurdismo cómico do filme são maravilhosamente transpostos para o seu
acompanhamento musical, tão necessário para a criação do peculiar tom do filme
como os seus visuais característicos.
Alex Ebert volta a colaborar com J.C. Chandor,
criando um ambiente musical pesado cheio de melancolia e uma certa nostalgia.
Os ritmos por vezes repetitivos têm um efeito quase hipnotizante no espetador,
tornando o filme numa espécie de marcha urbana para uma tragédia inevitável.
Hans Zimmer vai buscar muito a Philip Glass
naquele que é, talvez, a sua melhor colaboração com Christopher Nolan. A música
é tão forte e presente, que muitas vezes consome todos os outros sons do filme,
incluindo o diálogo. A muitos isto irritou, mas para mim este tipo de
dramatismo operático apenas exacerba o que na realidade é um épico sentimentalista
com momentos fugazes de génio. A música durante a cena em que McConaughey vê os
vídeos que foram enviados pelos seus filhos ao longo dos anos, é particularmente
louvável, Aí, Zimmer deixa a intensidade diminuir, não tentando descaradamente
manipular a audiência, mas mantendo o ambiente musical que é tão característico
do filme.
Melhor
Som
Adieux au
Language 3D
The Babadook
Gone Girl
Heaven Knows
What
Plemya
Adieux
au Language 3D está aqui pelo caos sonoro que consegue conjurar, sem
perder, no entanto, a sua clareza ou sentido de humor. A cena na casa de banho
é dos melhores exemplos do som como fonte de comédia. É inteligente ou
sofisticado? Não. Mas é refrescantemente juvenil e despretensioso quando temos
em consideração que o filme foi realizado por Jean-Luc Godard.
The Babadook e Plemya
usam o seu som para criar ambientes cheios de tensão e horror. O filme
australiano vai pelo caminho do som que quase chega ao expressionismo. Exageros
e ruídos de outros mundos perfeitamente realizados, de tal modo que ainda não
consegui apagar da minha memória o horrendo som da criatura central ao filme a
dizer o seu nome. O filme ucraniano segue um caminho mais naturalista, mas não
menos impactante. Num filme sem diálogo, o som dos ambientes torna-se central,
sendo que as cenas de repentina violência se tornam particularmente chocantes
pelos sons produzidos num filme em que o próprio ambiente sonoro parece
transmitir um tom de absoluta desolação.
O som no filme de
David Fincher é de especial relevância pelo modo como é usado para jogar com os
vários níveis de realidade e ficção dentro do filme. Poucas vezes é o som usado
de modo tão subjetivo e mutável como neste filme.
Finalmente, em Heaven Knows What, o som parece uma
mistura entre o usual som de pouca qualidade de filmes de baixo orçamento e um impulso
quase impressionista no tratamento de som. A integração da música com os ruídos
citadinos é de especial relevância, dando ao filme uma atmosfera quase sonâmbula.
Há ainda
alguns filmes de 2014 que não consegui ver. Pelo que estra lista pode vir a sofrer
algumas atualizações no futuro.
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