Tenho de admitir que
as minhas expetativas não eram particularmente positivas em relação a La Famille Bélier. Depois de ser exposto
aos trailers do filme e ter até lido algumas coisas sobre o filme, parecia-me que
apenas me esperava mais um filme forçosamente inspirador, cliché e
irremediavelmente sentimental. Estes não são os melhores pensamentos para se
ter quando se vê um filme pela primeira vez, mas admito que nem as minhas
baixas expetativas eram suficientemente baixas para o filme que tive de
aguentar durante 104 minutos.
Primeiro há que
falar um pouco da narrativa do filme, proveniente de um texto que, não me
perguntem como, precisou de quatro diferentes argumentistas para ser escrito. Paula
(Louane Emera) é uma jovem adolescente a viver numa comunidade rural em França,
sendo que a jovem é a única pessoa na sua unidade familiar que consegue ouvir,
sendo os seus pais, Gigi (Karine Viard) e Rodolphe (François Damiens), e o seu
irmão mais novo, Quentin (Luca Gelberg, surdos. Os pais, em particular, parecem
completamente dependentes da filha para agir como tradutora e intérprete.
Apesar de a sua
família ser incapaz de apreciar esse seu talento, Paula tem uma bela voz de
canto que é descoberta numa aula de coro em que a protagonista se tinha
inscrito para se aproximar do rapaz pelo qual nutre uma inocente paixoneta de
adolescente. Oportunidades são reveladas e Paula tem de escolher entre ir
estudar canto para Paris ou permanecer com a sua família que tanto parece
depender da sua audição. Não sei se seria um spoiler revelar o final, mas o filme é tão básico e cliché que
penso que já deve ser bastante claro como o filme termina. Um final lamechas e
inspirador, tudo acaba bem, e a audiência deve sair do cinema com umas lágrimas
nos olhos e umas horas bem passadas numa comédia francesa.
O que eu pensava
tratar-se de um filme com propósitos inspiradores e de promover as ideias de
igualdade etc., devido à publicidade e textos sobre o filme, acaba por ser
apenas uma pobre tentativa de capitalizar a popularidade da jovem protagonista,
uma antiga concorrente do The Voice
francês. Sendo assim, é um pouco injusto olhar o filme e examinar e criticar a
sua representação de uma família maioritariamente surda, visto que o filme não
parece fazer tenções de representar a comunidade em geral, mas é difícil fazer
evitar tal julgamento quando confrontado com o filme.
O facto da família de
Paula ser surda é apenas um dispositivo narrativo para salientar quão especial
e diferente o bonito floco-de-neve que é a nossa protagonista tão talentosa, e
ao mesmo tempo injetar humor no filme. Humor que consegue, apesar do seu tom
leve, ser incrivelmente desconfortável de observar. Os pais, em particular, são
reduzidos a duas caricaturas ridículas cuja surdez é uma constante fonte de
gozo. Quer seja numa cena em que a filha tem de traduzir os conselhos de um médico
em relação aos fungos genitais da mãe, a outra cena em que, devido à sua
surdez, os dois têm sexo enquanto uma das amigas da filha está em casa e fazem
um barulho imenso que se consegue ouvir por toda a parte.
Mas não é só a sua
surdez que é tornada numa pobre piada. As duas figuras paternais comportam-se
mais como adolescentes petulantes do que como adultos responsáveis. A mãe, em particular,
nas mãos de Karine Viard é um cartoon
em forma humana, como se a atriz tivesse olhado os Loony Toones e decidido que iria imitar as personagens que via,
exagerando ainda mais o seu comportamento. O único momento em que a atriz se
assemelha a uma presença minimamente plausível ou mesmo suportável, é uma cena
marcadamente dramática e até um pouco cruel, cuja carga emocional nunca parece
ser completamente justificada pelo resto do filme.
Muito disto seria
perdoado se o filme tivesse alguma piada, mas tentar encontrar comédia neste
filme é equivalente à procura de um glaciar no meio de um deserto africano. O
filme depende muitas vezes de humor crasso e pueril que, para além de estar
pejado de clichés e fórmulas cansativas, é mais desconfortável e ofensivo na
sua estupidez que verdadeiramente divertido. Eu sei que o humor é algo
particularmente subjetivo e que alguém talvez encontre neste filme o píncaro da
comédia cinematográfica, mas, para mim, acho plausível afirmar que já consegui
encontrar mais divertimento nos dramas de Ingmar Bergman.
Em termos de
realização e estilo, o filme é praticamente não-existente. Qualquer pessoa
podia tê-lo realizado, sendo que o filme caminha o difícil caminho entre a
absoluta banalidade medíocre e a incompetência técnica, sendo que a montagem do
filme é particularmente desastrosa.
O elenco de modo
geral é incrivelmente medíocre, sendo que apenas Luca Gelberg e Roxane Duran,
como o irmão e melhor amiga da protagonista, é que despertaram em mim qualquer
sombra de aprovação ou positivismo. Apesar de ter ganho o César para Revelação Feminina do ano passado, Louane Emera apenas mostra
um mínimo de carisma e competência, parecendo mais apropriada a um papel em um filme
televisivo do Disney Chanel que a uma das mais altas honras do cinema francês.
O filme é uma
experiência sem nada para oferecer, um star
vehicle sem grande estrela no seu centro. O humor é inconsequente ou, por
vezes, ativamente ofensivo e desconfortável. Mas, mais que toda essa coleção de
mediocridade e incompetência, o filme é incrivelmente aborrecido. É um filme
mau, mas a sua falta de ambição e completo apoio em clichés baratos faz dele
uma experiência abismal, nem chega a ser tão mau que é bom, é apenas um triste
exemplo de mediocridade cinemática.
Sem comentários:
Enviar um comentário