Hoje em dia parece que muitos confundem as palavras melhor
com mais, sendo que a melhor maneira de um filme assegurar uma nomeação para os
Óscares é demonstrar uma enorme grandiosidade vistosa nos seus aspetos
técnicos. Outrora, a montagem classicista de Hollywood deveria ser invisível e
eficiente, agora, parece que o objetivo de muitos filmes é tornar a montagem em
algo inescapável. É desses impulsos que devém a nomeação para Hank Corwin, um
editor que eu admiro pelo seu trabalho com Terrence Malick e Oliver Stone, mas
que este ano recebeu a sua primeira nomeação pelo que é, provavelmente, o seu
pior trabalho de sempre, The Big Short.
Também vistosa é a montagem de Margaret Sixel, a mulher de
George Miller, de Mad Max: Fury Road, não fosse este o filme de ação mais
explosivo a sair da produção de Hollywood nas últimas décadas. Igualmente
violento na sua intensidade sensorial, mas imensamente mais prosaico e
desinteressante na sua ideologia e intenções é The Revenant, que
assegura aqui mais uma nomeação para Stephen Mirrione que, com as suas
colaborações com Steven Soderbergh, já assegurou a sua importância no panteão
do cinema americano contemporâneo, tendo ganho um Óscar por Traffic
em 2000.
Outro vistoso filme de ação foi a grande surpresa desta
categoria, Star Wars: The Force Awakens. Todos estavam a prever que The
Martian fosse nomeado, mas o trabalho de Maryann Brandon e Mary Jo Markey aparentemente conseguiu capturar a atenção da Academia.
Por último temos o trabalho de Tom McArdle em Spotlight,
uma mostra de magnífica subtileza, tal como todos os aspetos do filme.
Francamente, apesar de ter incluído clips de cada um dos nomeados, grande parte
destes editores demonstram a sua grande mestria no modo como constroem ritmos
sublimes na totalidade dos seus filmes. Infelizmente em alguns destes filmes, é
esse aspeto a precisa desgraça da sua montagem.
RANKING DOS
NOMEADOS:
Por muito que eu ame o trabalho passado de Corwin, tenho de admitir que penso que o que este mestre da montagem fez em The Big Short é merecedor de um Razie especial. O filme de Adam McKay já é, só como uma narrativa, um pesadelo de indisciplina estrutural e estilística, mas com a montagem de Corwin, o desastre do filme é exacerbado a níveis desesperantes. Em todo o ano de 2015 este é o filme mais conspicuamente editado, pedindo à audiência que preste atenção à sua descoordenada tentativa de injetar energia nos procedimentos expositivos do filme. Infelizmente, essa procura de energia nunca é mais do que uma tentativa fracassada, sendo que a manipulação de Corwin é tão desastrada e declarativa que apenas consegue distrair a audiência. Aliás, isso segue todo a repugnante abordagem do filme que decide que vai oferecer à audiência uma barragem de importantes informações, ao mesmo tempo que continuamente tenta reduzir o peso e negar a seriedade dessas mesmas informações a partir de vistosas pirotecnias técnicas e estruturais. Para além de tudo isto, as descaradas quebras de continuidade, o desleixado uso de planos em movimentos e zooms constantes, e a constante obsessão em reduzir numerosas cenas a sequências de grandes planos caoticamente intercalados, apenas demonstram este raro e estranho rasgo de incompetência da parte de Hank Corwin.
4. Stephen Mirrione por The Revenant
Os meus problemas com o trabalho de Stephen Mirrione não se
encontram na sua montagem de cenas individuais ou sequências, mas sim na sua
orquestração da totalidade do filme. Em momentos individuais e examinados em
separado do completo The Revenant, o trabalho de Mirrione
é impressionante, especialmente na sua reticência e uso mínimo de cortes,
deixando a movimentação da câmara de Lubezki esvoaçar pelo espaço, conferindo à
audiência um assombroso sentido de realidade espacial e temporal. Quando Mirrione
passa de um plano para outro, as suas escolhas raramente parecem arbitrárias,
mas sim o resultado de uma cuidada consideração dos ritmos internos de cada
momento. Infelizmente, tal mestria rítmica está ausente da tapeçaria
cinematográfica que é o filme completo que, com 156 minutos, é uma experiência
de repetição exaustiva das mesmas ideias e incontornável tédio. É fácil
imaginar uma versão de The Revenant que, apesar de conter
os mesmos problemas ideológicos característicos da abordagem formal e narrativa
de Iñarritu, seria um filme muito superior, simplesmente pela sua brevidade e
eficiência estrutural. No final, a extensa e desnecessária duração de The
Revenant serve apenas como mais um elemento de perniciosa hubris
cinematográfica e desleixada ambição por uma importância e complexidade que o
filme simplesmente não possui.
´
3. Maryann
Brandon e Mary Jo Markey por Star Wars: The Force Awakens
O trabalho de Maryann Brandon e Mary Jo Markey no mais recente filme da saga Star Wars é quase que o reverso dos esforços de Stephen Mirrione em The Revenant. O ritmo que estas duas editoras encontram na totalidade de Star Wars: The Force Awakens é fenomenal, não permitindo que o filme caia em desnecessários momentos mortos, e tecendo uma formidável tapeçaria de novas narrativas e caracterizações que se apresentam em perfeito equilíbrio. Há que louvar o modo como estas editoras parecem ter-se recordado que um ritmo lento e duração extensa não são necessariamente marcas de qualidade ou elementos que contribuam para uma experiência “épica”, sendo que o seu trabalho é muscular e eficiente a um nível raramente visto em blockbusters deste tipo no atual panorama do cinema americano. Por outro lado, existem inúmeras sequências individuais em que a montagem deixa algo a desejar, como no clímax final em que Abrams está declarativamente a copiar a mesma multiplicidade de cenas de ação que tanto caracterizam o final de O Regresso do Jedi. Neste filme, infelizmente, o equilíbrio da montagem trai a tensão da narrativa e perde a intensidade necessária para tal explosão de ação. Outros momentos individuais pecam por uma desleixada manipulação de planos e durações que nunca chegam à qualidade dos filmes anteriores, sendo que a cena nos domínios de Maz Kanata é uma triste e ineficaz imitação dos ritmos de um momento imensamente semelhante no primeiro filme de 1977.
2. Tom McArdle por Spotlight
De entre esta coleção de nomeados, o trabalho de Tom McArdle é, sem dúvida, o mais discreto e convencionalmente classicista. Há pouco de vistoso ou conspícuo na abordagem deste editor, com a sua simples concretização de inúmeros diálogos e entrevistas a ser a principal marca estilística da montagem de Spotlight. O modo como McArdle edita estas cenas dominadas pela partilha de informação é simples, mas eficiente, com a atenção de McArdle às reações silenciosas dos seus atores a ser particularmente louvável. Mesmo assim, o grande destaque do seu trabalho em Spotlight é o modo como os ritmos precisos de McArdle fazem com que a narrativa se mova com uma surpreendente velocidade, apesar da carga informativa que tem de suportar. Quando acabei de ver Spotlight, não conseguia acreditar que já tivessem passado mais de duas horas e esse é um dos maiores elogios que eu posso dar a um editor.
1. Margaret
Sixel por Mad Max: Fury Road
PREVISÕES E DESEJOS:
Quem vai ganhar: Margaret Sixel (acho que estou em negação das
probabilidades de Hank Corwin ganhar este Óscar)
Quem eu quero que ganhe: Margaret Sixel
Quem merece ganhar: Margaret Sixel
5 escolhas alternativas que a Academia ignorou*:
- Affonso Gonçalves por Carol
- Julio Perez IV por It Follows
- Valentyn Vasyanovych por Plemya
- Joe Walker por Sicario
*Esta seleção
pessoal tem por base a lista de elegibilidade da Academia e não a generalidade
de 2015 enquanto ano cinematográfico.
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