Mesmo que eu não concorde por completo com esta seleção de
nomeados, tenho de dizer que esta é das melhores categorias nesta edição dos
Óscares. Mesmo o trabalho de Robert Richardson que eu considero como o pior
destes cinco, é um exemplo de imensa ambição visual.
À qualidade geral da categoria ajuda o facto que estes cinco
diretores de fotografia são alguns dos melhores a trabalhar no cinema
contemporâneo, sendo que três destes homens já são vencedores de edições anteriores.
Richardson, que é um frequente colaborador de Quentin Tarantino e Martin
Scorsese, já ganhou três Óscares pelo seu trabalho em JFK de Oliver Stone e The
Aviator e Hugo de Scorsese. John Seale arrecadou o Óscar pelo seu
trabalho em The English Patient, um épico situado no deserto africano com
um estilo completamente distinto do filme de George Miller pelo qual este
diretor de fotografia se encontra indicado este ano.
É difícil recordar o tempo, há 3 anos, em que Emmanuel Lubezki era um dos eternos injustiçados da Academia. A sua filmografia é uma
coleção de triunfos geniais, sendo que as suas colaborações com Alfonso Cuáron
e Terrence Malick são de particular destaque. Aliás, apesar do seu primeiro
Óscar ter vindo de uma colaboração com Cuáron em Gravity, é fácil de perceber
que foi a ligação estética de Lubezki ao cinema de Malick que levou o
realizador de The Revenant a tanto posicionar o seu trabalho, especialmente o
movimento de câmara e vistoso uso de luz natural, como componente principal do
discurso visual do filme.
Do outro lado desta equação de magistrais diretores de
fotografia temos Roger Deakins e Ed Lachman. O diretor de fotografia de Carol
é um indiscutível mestre desta arte, sendo que o seu trabalho em Longe
do Paraíso é um dos píncaros do cinema da década passada, mas entre
estes dois, Deakins é quem merece finalmente levar para casa um Óscar depois da
sua carreira e numerosas nomeações sem sucesso. Para além do mais, com a sua
contribuição para o cinema de animação, poder-se-á afirmar que destes nomeados,
apenas Deakins realmente avançou e desenvolveu a fotografia de cinema enquanto
técnica e arte.
RANKING DOS
NOMEADOS:
5. Robert
Richardson por The Hateful Eight
Filmado em pelicula de 65mm, mais tarde exposta nos cinemas
em 70mm, Os Oito Odiados é uma obra que procura reproduzir a opulência
majestosa dos spaghetti westerns dos anos 60 e 70, nomeadamente as obras de
mestres como Sergio Leone e Carlos Simi. O píncaro do trabalho de Robert
Richardson neste filme é certamente a primeira secção do filme, situada nos
exteriores nevosos do Wyoming. A escala épica das imagens conjuradas por
Richardson são arrebatadoras, utilizando por completo o esplendor daquele que é
o formato mais largo disponível. Quando o filme se fixa no interior da Minnie’s
Haberdasherie, Richardson perde a beleza monumental do mundo natural e o
formato do filme é como que posto em direto contraste com as limitações
claustrofóbicas do ambiente físico. Isto é uma escolha interessante, mas as
composições e a iluminação de Richardson ricas em contraluzes e esquemas
artificialmente dramáticos, conferem ao filme uma debilitante teatralidade que
retira dinamismo visual a toda a construção de Os Oito Odiados.
4. Emmanuel Lubezki por The Revenant
Com o seu uso exclusivo de luz natural e uma orgiástica
utilização de complexos movimentos de câmara, a fotografia de The
Revenant é quase uma paródia do estilo característico de Emmanuel
Lubezki. Na sua generalidade, as escolhas deste génio mexicano demonstram a sua
usual mestria, sendo que as paisagens verdejantes que normalmente se encontram
no seu trabalho com Malick são aqui substituídas por uma paisagem de gélida
frieza invernal. A única coisa que eu consigo realmente apontar a um nível
técnico é a redundância desta nomeação, pois estes mecanismos estilísticos
foram há muito desenvolvidos e mostrados, de modo mais triunfante, em filmes
anteriores, sendo que muitos deles foram ignorados pelos Óscares. No entanto, a
um nível conceptual, o trabalho de Lubezki acaba por exacerbar alguns dos monumentais
problemas que eu tenho com esta obra de Alejandro G. Iñarritu, nomeadamente o
modo a abordagem de Lubezki mostra aqui uma polidez coreografada que não se
encontrava em filmes como O Novo Mundo, assim como uma obsessão em filmar
Leonardo DiCaprio a partir de grotescos ângulos e intrusivos grandes planos que
vão realçando o seu sofrimento de um modo quase pornográfico. Um trabalho
indubitavelmente belo e primoroso, mas que não demonstra grande complexidade
conceptual e apenas ajuda o filme a cair em algumas das suas mais perniciosas
fragilidades.
3. John
Seale por Mad Max: Fury Road
Já escrevi um inteiro post sobre a genialidade das imagens
de Mad
Max: Estrada da Fúria, mas, apesar disso, é impossível elogiar em
demasia o trabalho de Seale nesta obra-prima do cinema de ação contemporâneo. O
uso de cores saturadas, reduzindo o filme a uma tempestade de laranjas acídicos
e azuis cortantes, é uma parte essencial da estética do filme, mas também há
que salientar outras escolhas visuais de Seale, como a sua mestria na captura
dos minúsculos detalhes inseridos em todos os adereços, espaços e roupas,
contribuindo consideravelmente para o visual ensandecidamente barroco desta
obra da saga Mad Max. A acrescentar a estes elementos cromáticos e de foque,
as composições e movimentos conjurados por Seale são igualmente magistrais,
sendo que alcançar tal perfeição não terá sido tarefa fácil com o constante
movimento dos principais cenários do filme, as condições das filmagens no
deserto, e a colossal quantidade de efeitos visuais práticos utilizados neste
filme.
2. Roger
Deakins por Sicario
Esta é a 13ª nomeação de Roger Deakins. 13ª!!!! Alguém dê um
Óscar a este homem por favor…
Continuando. Apesar do trabalho de Deakins em Sicario não estar aos níveis do que ele alcançou em Skyfall, por exemplo, no que diz respeito a alargar os horizontes da fotografia digital, há que reconhecer a sua incalculável contribuição para o filme. A um nível mais conceptual, é impossível não celebrar o modo como Deakins se recusa veemente a diferenciar entre os EUA e o México com uso de luzes amarelas ou filtros, reduzindo ambas as nações a infinitas extensões de desertos esbranquiçados e sem vida. Isto pode parecer pouco, mas tendo em conta o que se pode ver na televisão e cinema americano desde 2000, a abordagem de Deakins é quase revolucionária, indo de encontro aos elementos mais inteligentes e subversivos do guião. A um nível mais técnico, o modo como Deakins captura o céu e a própria atmosfera dos espaços fechados é algo que mais nenhum diretor de fotografia consegue reproduzir, sendo que aqui existe uma estonteante palpabilidade nas imagens. A acrescentar a estes elogios tenho de destacar a maravilhosa precisão e cortante uso de luz nas cenas noturnas, algo que, pelo menos desde Fargo em 1996, se tem provado como uma das especialidades de Deakins.
Continuando. Apesar do trabalho de Deakins em Sicario não estar aos níveis do que ele alcançou em Skyfall, por exemplo, no que diz respeito a alargar os horizontes da fotografia digital, há que reconhecer a sua incalculável contribuição para o filme. A um nível mais conceptual, é impossível não celebrar o modo como Deakins se recusa veemente a diferenciar entre os EUA e o México com uso de luzes amarelas ou filtros, reduzindo ambas as nações a infinitas extensões de desertos esbranquiçados e sem vida. Isto pode parecer pouco, mas tendo em conta o que se pode ver na televisão e cinema americano desde 2000, a abordagem de Deakins é quase revolucionária, indo de encontro aos elementos mais inteligentes e subversivos do guião. A um nível mais técnico, o modo como Deakins captura o céu e a própria atmosfera dos espaços fechados é algo que mais nenhum diretor de fotografia consegue reproduzir, sendo que aqui existe uma estonteante palpabilidade nas imagens. A acrescentar a estes elogios tenho de destacar a maravilhosa precisão e cortante uso de luz nas cenas noturnas, algo que, pelo menos desde Fargo em 1996, se tem provado como uma das especialidades de Deakins.
1. Ed Lachman por Carol
Inspirando-se na fotografia de Saul Leiter e utilizando película
de 16mm, Ed Lachman criou um dos filmes mais belos de 2015 e certamente o mais
elegante. Ao contrário da sua abordagem em Longe do Paraíso em que este diretor
de fotografia reproduziu a luxuriante cor e artificialidade dos melodramas de
Douglas Sirk, o trabalho de Lachman em Carol demonstra uma abordagem
infinitamente mais subtil na captura da atmosfera visual de uma época passada. As
imagens parecem fotografias granuladas que ganharam vida, com cores esbatidas e
sedutoramente suaves, que por vezes desvendam rasgos de intensidade cromática
em pormenores como as unhas rosa numa mão perfeitamente cuidada ou o amarelo de
uma blusa. Como a narrativa romântica do filme, a sua fotografia existe assim
num plano de constante equilíbrio formal, quase frio, que vai sendo quebrado em
explosões apaixonantes de dinamismo visual. Apesar de toda esta beleza, no
entanto, Lachman permite a existência de um inesperado realismo, permitindo que
certos ambientes urbanos se exponham na sua fealdade monótona, sem os
glamourizar com as suas lentes, sem, como que por milagre, perder o equilíbrio
visual de toda a obra. Francamente, Lachman merece o Óscar nem que seja apenas
pelas cenas passadas dentro do carro da personagem titular, onde os vidros e as
gotículas de chuva se tornam em mundos de infinito prazer visual, e o olhar das
personagens se materializa nas imagens de Lachman que, com o seu uso de baixas
profundidades focais, se parecem desmaterializar em manchas de luz, cor e
hipnotizante movimento.
PREVISÕES E DESEJOS:
Quem vai ganhar: Emmanuel Lubezki
Quem eu quero que ganhe: Roger Deakins
Quem merece ganhar: Ed Lachman
5 escolhas alternativas que a Academia ignorou*:
- Maryse Alberti por Creed
- Adam Arkapaw por Macbeth
- Ali Olcay Gözkaya por Praia do Futuro
- Sturla Brandth Grøvlen por Victoria
- Steven Soderbergh por Magic Mike XXL
*Esta seleção
pessoal tem por base a lista de elegibilidade da Academia e não a generalidade
de 2015 enquanto ano cinematográfico.
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