sábado, 13 de fevereiro de 2016

Oscars 2015/16, MELHOR ATRIZ SECUNDÁRIA




Aquilo a que se deu o nome de “category fraud” raramente é discutido durante a Awards Season, a não ser que o vosso blogue de eleição seja The Film Experience. Este ano, no entanto, isso mudou, e várias publicações decidiram criar uma enorme controvérsia em volta das campanhas fraudulentas feitas pelos estúdios em que atores e atrizes principais são promovidas como secundários para que mais facilmente arrecadem uma nomeação. Algumas organizações, como a HFPA, decidiram retificar estas ridículas injustiças, acabando por nomear Rooney Mara e Alicia Vikander na categoria de Melhor Atriz Principal.

Eu há vários anos que detesto este tipo de campanhas mercenárias, e este ano finalmente parece que o resto do mundo acordou para esta situação, que já resultou em muitas categorizações ridículas e detestavelmente desonestas. Infelizmente, parece que a Academia pouco se importa com isto, sendo que as grandes favoritas ao Óscar de Melhor Atriz Secundária são duas prestações indubitavelmente principais. Alicia Vikander irá provavelmente ganhar por um filme que se apoia na tragédia da sua personagem face à transição do seu marido numa mulher em A Rapariga Dinamarquesa.

Ainda mais absurda é a pretensão que Therese Belivet, interpretada por Rooney Mara, é uma personagem secundária em Carol. Apesar do seu título, este é um filme sobre um romance entre duas mulheres e ambas são igualmente fulcrais para a narrativa. Eu diria mesmo que, entre as duas, Mara é muito mais protagonista que Cate Blanchett, sendo que o filme se inicia e termina na sua perspetiva pessoal e esse seu olhar é uma constante em quase toda a narrativa, tal como no romance original de Patricia Highsmith.

Como consequência das campanhas fraudulentas destes filmes, o resto das atrizes nomeadas estão incrivelmente prejudicadas, sendo que poucas pessoas têm discutido as suas prestações ou probabilidade de ganharem o Óscar. Entre Rachel McAdams, Jennifer Jason Leigh e Kate Winslet, talvez a atriz britânica seja a única com alguma esperança de arrecadar o galardão pelo seu trabalho em Steve Jobs, tendo já alcançado uma inesperada vitória nos Golden Globes.




RANKING DOS NOMEADOS:



5. Alicia Vikander em The Danish Girl


Depois de um ano marcado pelo sucesso e omnipresença nos cinemas, Alicia Vikander tem a infeliz honra de ser reconhecida pela Academia pela que é provavelmente a pior prestação que a atriz teve em filmes elegíveis aos óscares deste ano. O meu ódio por A Rapariga Dinamarquesa será bem conhecido para quem tiver lido a minha análise na MagazineHD, pelo que, possivelmente, estou a deixar que a qualidade geral do filme influencie de modo prejudicial a minha perspetiva sobre a prestação desta jovem estrela em ascensão. É inegável que, de todos os atores desta miséria cinematográfica, Alicia Vikander é quem mais se destaca, injetando uma curiosa contemporaneidade e energia carismática à narrativa. Infelizmente, Tom Hooper e o argumento estão longe de querer aproveitar esta carismática presença jovial, forçando a atriz a interpretar uma infinita sequência de momentos trágicos em que a única abordagem desta intérprete é a de lacrimejar de modo atraente. Não culpo Vikander pela bidimensionalidade da sua personagem, mas é frustrante ver a sua luminosa presença nos primeiros momentos do filme ser reduzida a uma desastrada acumulação de cenas repetitivas que culminam no odioso final do filme, em que a manipulação emocional chega a níveis tão descarados que são quase risíveis, não tivesse o tédio já atordoado a audiência quando o misericordioso final de A Rapariga Dinamarquesa finalmente se manifesta. E pensar que Vikander podia ter sido nomeada por Ex Machina, em que, apesar de também interpretar uma personagem principal, a sua prestação é incalculavelmente mais complexa e fascinante que a sua encarnação de Gerda Wegener em A Rapariga Dinamarquesa.



4. Jennifer Jason Leigh em The Hateful Eight


Eu sou um grande fã de Jennifer Jason Leigh e, até há pouco tempo, também me considerava um fã de Quentin Tarantino, sendo que a sua coleção de formidáveis personagens femininas sempre foi algo que me encantou na maioria da sua filmografia. Mesmo tendo em conta as minhas reservas em relação a Os Oito Odiados, eu não esperava, de todo, que acabaria por considerar a prestação de Leigh como uma das menos interessantes em todo o filme. Tal como em A Rapariga Dinamarquesa, o meu problema com a prestação desta formidável atriz depreende de questões textuais e de direção mais do que o trabalho concreto da intérprete. Em resumo, do mesmo modo que todas as personagens de Os Oito Odiados são mais símbolos que humanos credíveis, também Daisy Domergue, a personagem de Jennifer Jason Leigh, é uma unidimensional e inumana presença, cuja principal característica é a sua bizarra atitude de constante antagonismo e vitriólico ódio por todos os que a rodeiam. De certo modo, especialmente no seu persistente uso de insultos raciais, Domergue é como que uma personificação do doentio niilismo de Tarantino face à realidade social e cultural do seu país, como que incorporando aqueles que são, para mim, os piores elementos ideológicos do filme. Eu poderia então simplesmente descartar a falta de complexidade ou credível humanidade de Domergue aos problemas originados no trabalho de Tarantino, mas o facto é que Walton Goggins e Samuel L. Jackson pegam num material imensamente semelhante ao de Leigh e encontram nos seus papéis uma formidável e carismática teatralidade, assim como sugerem nas suas reações algo mais humano e complicado que a caracterização oferecida no texto de Tarantino. Jennifer Jason Leigh, infelizmente, não tem aqui a mesma habilidade e genialidade desses dois atores, e o seu trabalho tem a mesma complexidade e credibilidade que um simplista cartoon. O melhor do seu trabalho é mesmo a sua energia e grotesca capacidade de fazer de cada um dos seus movimentos uma juvenil e jovial manifestação do ódio que propulsiona todas as ações de Daisy, fazendo de alguns momentos, como a sua pantomima de um enforcamento, pequenos instantes de triunfante comédia negra.



3. Rachel McAdams em Spotlight


Rachel McAdams recebeu o tipo de nomeação típica de filmes com o estatuto de frontrunner na corrida ao Óscar de Melhor Filme. Sendo a única mulher num elenco quase exclusivamente masculino, a atriz salta imediatamente à vista e a sua nomeação é uma fácil maneira de celebrar o filme e lhe atribuir mais uma nomeação. Apesar da sua nomeação se dever quase exclusivamente à qualidade geral de Spotlight e ao seu prestígio enquanto favorito da Awards Season, o trabalho de Rachel McAdams como Sacha Pfeiffer, a única mulher na equipa Spotlight do Boston Globe aquando da narrativa do filme, não é de menosprezar. Superficialmente, McAdams não tem nenhuma da pirotecnia emocional ou técnica das outras nomeadas nesta categoria, mas, tal como quase tudo neste filme, a modéstia e subtileza não são indicadores de mediocridade. A prestação de McAdams é construída maioritariamente a partir de reações silenciosas, sendo que a sua personagem tem como principal função ouvir e assimilar a informação proferida por outros. Isso pode parecer algo simples, mas é raro observar alguém, num filme de Hollywood, tão perfeitamente recriar o processo de se ouvir e processar mentalmente a informação que vamos registando. Na sua postura, nos seus olhares, na sua mínima expressividade, McAdams oferece uma formidável prestação que é principalmente louvável pelo modo como se recusa a chamar a atenção para si mesma. Talvez o seu mecanismo interpretativo mais visível seja mesmo a sua mudança de postura e atitude quando está em casa, num ambiente familiar. Há algo de inteligentemente reticente e inseguro nestes momentos, como se McAdams estivesse a telegrafar uma vulnerabilidade incompatível com a vida profissional de Sacha mas que se pode manifestar face à sua família, nomeadamente à sua avó. Um trabalho que está longe de ser gritado, mas que também está distante de ser uma nomeação não merecida.



2. Kate Winslet em Steve Jobs



Da minha análise de Kate Winslet em Steve Jobs:

“Num filme que decorre em palcos e bastidores, Winslet torna Joanna em atriz, encenadora, produtora, assistente e contrarregra dos acontecimentos à sua volta. Steve Jobs pode ser a estrela deste filme, mas sem a presença da Joanna Hoffman de Winslet todo o edifício cinematográfico cairia por terra. Esta não será das mais reveladoras interpretações da atriz mas é das mais inteligentes e das mais necessárias dentro do seu filme.”

Apesar de um sotaque duvidoso, mantenho a minha admiração por esta prestação que, sendo secundária, receberia o meu voto nesta categoria. Posso ter alguns problemas com o texto do filme, mas Winslet prova-se exímia na modulação dos barrocos diálogos de Aaron Sorkin e as suas cenas com Michael Fassbender são uma supernova de carisma de verdadeiras estrelas de cinema, sendo os melhores momentos do filme. Finalmente a Kate Winslet que eu adorava voltou, só espero que a atriz consiga manter este nível de energética qualidade nos seus futuros trabalhos.



1. Rooney Mara em Carol


Da minha crítica de Carol, originalmente publicada na MagazineHD:

“Mara encontra-se num registo bastante distante do adotado pela sua coprotagonista, sendo que de modo magistral a atriz se torna num espelho humano, refletindo as emoções e perceções que terceiros projetam na sua pessoa. A sua expressividade é mínima quando comparada com a sinfonia que se revela na face de Blanchett, mas, ao longo do filme, Mara desabrocha em contidas explosões de emoção naturalista, como se a sua reação surpreendesse a sua própria personagem. E é aí que se encontra a mestria na sua abordagem, tornando Therese numa insularidade confusa mesmo para si mesma, uma mulher em crescimento, autodescoberta e processo de definição pessoal confrontada com uma oportunidade romântica de esmagadora e inesperada intensidade. Com a sua reticência, que nunca cai em opacidade emocional, é fácil perceber a fascinação que Therese desperta na personagem titular.”

Sinceramente, Rooney Mara dá em Carol a melhor prestação de qualquer ator ou atriz no cinema de 2015, mas, devido ao facto de ela estar categorizada como uma atriz secundária, eu nunca lhe daria o meu voto. Mesmo assim, esta é uma miraculosa interpretação que, pela sua subtileza e magistral recusa de seguir os impulsos estilísticos da sua coprotagonista, é duplamente admirável. Uma corajosa e meticulosa abordagem que, em olhares, minúsculas expressões, ou no reticente virar da sua cabeça consegue expressar uma tempestade emocional, explosivamente humana e delicadamente simples.



PREVISÕES E DESEJOS:

Quem vai ganhar: Alicia Vikander

Quem eu quero que ganhe: Kate Winslet

Quem merece ganhar: Kate Winslet (Mara dá a melhor prestação, mas não merece este prémio ao ser uma protagonista)



5 escolhas alternativas que a Academia ignorou*:

  • Angela Bassett em Chi-Raq
  • Kristen Wiig em The Diary of a Teenage Girl



*Esta seleção pessoal tem por base a lista de elegibilidade da Academia e não a generalidade de 2015 enquanto ano cinematográfico.


Sem comentários:

Enviar um comentário