De todas as categorias dos Óscares, esta é a única que ainda
se mantém com apenas três nomeados, para além de ter sido uma das categorias
mais tardiamente criadas, sendo que este Óscar foi pela primeira vez entregue, num
panorama competitivo, a An American Werewolf in London
de 1981. O ridículo desta situação é inegável, especialmente quando
consideramos que praticamente todos os filmes têm departamentos de
caracterização. Esta é uma componente técnica que merece, na minha opinião,
muito mais reconhecimento que, por exemplo, canções originais ou mesmo efeitos
especiais, dois aspetos que marcam presença num número relativamente diminuto
de filmes.
Ao longo da sua breve história esta categoria tem sido
dominada por vistosas transformações feitas à base de prostéticos, ignorando,
infelizmente, outros tipos de caracterização, igualmente louvável mas muito
menos vistosa. Mesmo com a recente alteração do nome desta categoria de “Best Achievement
in Makeup” para “Best Achievement in Makeup and Hairstyling”, os seus nomeados
ainda são maioritariamente caracterizados por explosões de pirotecnia técnica e
chamativos virtuosismos, sendo que trabalhos mais subtis são tradicionalmente
esquecidos aquando das nomeações.
Outro interessante aspeto desta categoria é a sua curiosa
propensão para nomear filmes completamente inesperados ou desconhecidos. A
indicação mais surpreendente deste ano é certamente O Centenário Que Fugiu Pela
Janela e Desapareceu, um filme sueco que poucos conheciam antes de ter
sido divulgada a lista de finalistas para esta categoria.
Em termos de previsões, eu penso que qualquer um destes
nomeados poderá alcançar uma vitória dia 28 deste mês. The Revenant, com as suas
12 nomeações, é um dos óbvios favoritos da Academia e a transformação de
Leonardo DiCaprio é capaz de arrecadar atenção suficiente para que o filme
ganhe este troféu. Por outro lado, Mad Max: Estrada da Fúria tem uma
maquilhagem muito mais vistosa e variada que The Revenant, assim como
um considerável apoio da Academia, com 10 nomeações incluindo para Melhor
Filme. Por fim, O Centenário Que Fugiu Pela Janela e Desapareceu é uma
descarada montra para um dos tipos de maquilhagem prediletos da Academia,
caracterização de envelhecimento, pelo que este filme poderá também ser um
viável vencedor.
RANKING DOS NOMEADOS:
3. Hundraåringen som klev ut genom fönstret och försvann, Love Larson e Eva Von Bahr
Eu não partilho a louca adoração da Academia por maquilhagem
de envelhecimento, sendo que, para mim, os resultados de tais transformações
são raramente plausíveis e acabam por usualmente se tornar numa distração
perniciosa para a total qualidade de um filme. Em O Centenário Que Fugiu Pela
Janela e Desapareceu, a maquilhagem é a verdadeira estrela do filme e o
seu melhor aspeto. Tendo em conta a qualidade do filme como um todo, dizer que
a maquilhagem é o seu melhor aspeto está longe de ser um elogio com algum
módico de positivismo. Na verdade, para mim, a maquilhagem deste filme é pouco
mais que uma montra de virtuosismos técnicos sem pouca ponderação sobre os
efeitos dessa mesma técnica na experiência do filme. As transformações de
vários atores em personalidades célebres da história europeia e americana são particularmente
atrozes, convertendo atores em descaradas caricaturas ao invés de credivelmente
povoarem o filme com alguns dos seres humanos mais significativos na história
do século XX. Independentemente desses cameos de personalidades como Francisco
Franco e Josef Stalin, a principal transformação do filme é o progressivo
envelhecimento da personagem principal que vemos desde que é criança até à
idade centenária do título. Esta é uma impressionante maquilhagem, mas,
especialmente nas etapas mais avançadas da idade do protagonista, a
caracterização tem uma feia tendência em limitar os movimentos faciais do ator
de modo notório. Um trabalho impressionante e vistoso, mas pouco sofisticado ou
particularmente louvável.
2. The Revenant, Sian Grigg, Duncan Jarman e Robert A. Pandini
Sian Grigg é o homem responsável pela caracterização de
Leonardo DiCaprio em todos os seus filmes desde Titanic. Só pela
longevidade desta colaboração e pela geral celebração de DiCaprio nesta Awards
Season, eu penso que esta equipa poderá ganhar o Óscar, por muito que esse
galardão pouco se vá dever ao seu concreto trabalho e mais a uma narrativa típica
destes prémios de cinema. É claro que devemos lembrar que essa colaboração já
resultou em desastres como a gárgula rugosa que foi Leonardo DiCaprio no final
de J.
Edgar, sendo que, felizmente, The Revenant não é um deles. A
coleção de mazelas e horrendas feridas que cobrem o corpo do protagonista de The
Revenant são impressionantes e bastante vistosas, apesar de por vezes
serem pouco convincentes. Apesar dessa transformação física representar a parte
mais memorável da caracterização de The Revenant, eu diria mesmo que é o
menos louvável elemento da sua maquilhagem. Muito mais interessante e admirável
é, para mim, a caracterização das personagens nativo americanas, um trabalho
que revela uma magnífica pesquisa histórica e cuidada procura por uma
autenticidade incomum neste tipo de cinema, mesmo na nossa contemporaneidade.
Igualmente fantástico, é a caracterização das restantes personagens que
inicialmente acompanham a personagem de DiCaprio, sendo que a maquilhagem se
torna numa parte essencial da mise-en-scène ao perfeitamente registar o efeito
das duras condições climatéricas nas faces cansadas do elenco.
1. Mad Max: Fury Road, Lesley
Vanderwalt, Elka Wardega e Damian Martin
Para mim, esta é a única escolha racional nesta categoria.
Como é possível negar a genialidade da caracterização de Mad Max: Estrada da Fúria?
Enquanto os outros dois nomeados apresentam uma minúscula variedade estilística
nas suas façanhas de maquilhagem, com as marcas de sofrimento humano em The
Revenant e o envelhecimento em O Centenário Que Fugiu Pela Janela e
Desapareceu, a obra-prima de George Miller é uma maravilhosa coleção de
variedade imagética com cada personagem a oferecer uma perfeita concretização
visual, que muitas vezes tende a cair numa magistral explosão de bizarro e
grotesco. O filme mereceria o Óscar somente pela genial e simples maquilhagem
de Charlize Theron com a sua face coberta por óleo de motor, mas ainda temos os
doentios War Boys com as suas numerosas variações de uma aparência cadavérica,
o esplendor das noivas de Imortan Joe, a pele ressequida desse mesmo ditador,
as tatuagens que cobrem o corpo de Miss Giddy, as marcas do escaldante sol do
deserto nas faces das Vuvalini e até a horrenda e estranhíssima face do
guitarrista do exército em perseguição dos nossos heróis. Um trabalho
absolutamente genial, completamente inesquecível, e magistralmente coeso na sua
criação de uma credível realidade pós-apocalíptica. Bravo!
PREVISÕES E DESEJOS:
Quem vai ganhar: The Revenant
Quem eu quero que ganhe: Mad Max: Fury Road
Quem merece ganhar: Mad Max: Fury Road
3 escolhas alternativas que a Academia ignorou*:
- Carol, Jerry DeCarlo e Patricia Regan
- Macbeth, Jenny Shircore, Joe Hopker e Marc Pilcher
- Spy, Debra Denson, Trefor Proud, Sarah Love e Linda D. Flowers
*Esta seleção pessoal tem por base a lista de elegibilidade
da Academia e não a generalidade de 2015 enquanto ano cinematográfico.
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