Independentemente das minhas opiniões sobre o seu trabalho
nestes filmes em particular, esta categoria junta-se a Melhor Fotografia como
tendo um dos mais ilustres e talentosos grupos de nomeados nesta presente
edição dos Óscares.
Adam Stockhausen é um genial cenógrafo em meteórica
ascensão, tendo arrecadado um Óscar o ano passado por Grand Budapest Hotel. O
seu trabalho em Bridge of Spies é caracterizado por cuidadas e vistosas
reconstruções de época sendo que não é de admirar a sua presença nestes
nomeados.
De modo semelhante, Eve Stewart assegurou a sua quarta
nomeação a este galardão com mais uma construção de cinema de época,
requintadamente pontuado com a exuberante elegância dos ambientes artísticos e
sofisticados da França e Dinamarca da década de 20 do século passado. A sua
relação profissional com o realizador Tom Hooper tem sido imensamente benéfica
para Stewart que tem sido consistentemente um dos mais fortes aspetos dos
filmes deste realizador, e tem sempre conseguido arrecadar uma indicação para o
Óscar. Infelizmente, ao contrário de Stockhausen, Stewart ainda não foi
completamente celebrada pela Academia.
Igualmente desprovido de um Óscar está Jack Fisk, um homem
que se poderia considerar uma verdadeira lenda da cenografia para cinema. Fisk
ganhou fama e respeito pelas suas gloriosas colaborações com autores como Brian
de Palma, David Lynch, Paul Thomas Anderson e Terrence Malick, mas será certo
afirmar que foi o seu trabalho com este último nome que garantiu a sua
participação em The Revenant. Apesar de ser um filme de época, a mais recente obra
de Alejandro González Iñarritu é caracterizada por uma constante presença do
mundo natural de tal modo que a indicação de Fisk é uma agradável surpresa,
assim como um bom exemplo de como não é apenas o trabalho em cuidados
interiores que representa boa cenografia.
Igualmente focado em exteriores é Mad Max: Fury Road, o
filme pelo qual o australiano Colin Gibson se encontra a desfrutar a sua
primeira indicação aos Óscares. Tal como já tinha anteriormente referido, a
celebração deste tipo de trabalho focado em veículos e grotescas visões de
ficção-científica está longe de ser algo usual nestes prémios da Academia, mas
é impossível ignorar a genialidade deste trabalho.
Por fim, Arthur Max é aqui nomeado pela terceira vez, de
novo por um trabalho com Ridley Scott, o seu realizador de eleição. Será que é
desta que Max irá arrecadar um Óscar pelo seu trabalho com o realizador
britânico? A natureza quase contemporânea de The Martian apontaria
normalmente para um fracasso certo, mas com um ano tão imprevisível como este,
nunca se sabe se Max não acabará como o grande vencedor desta categoria.
RANKING DOS NOMEADOS:
5. Arthur Max e Celia Bobak por The Martian
Baseando-se em designs e projetos experimentais da NASA,
Arthur Max criou em The Martian uma hiper-realista visão do que poderia ser, tendo
em conta o estado atual da tecnologia espacial, uma missão a Marte. Essa
procura de realismo informou todos os detalhes da cenografia deste filme de
Ridley Scott, com as próprias escolhas de cores a serem diretamente
influenciadas pelos materiais usados pela NASA atualmente. Apesar dos figurinos
do filme terem investidos num incomum uso de laranjas e azuis vivos, os espaços
da narrativa são caracterizados pelo mesmo branco clínico que domina tantos
outros filmes semelhantes. Aliás, essa é a principal fragilidade no trabalho de
Max, que, na sua pesquisa e construção verossímil, acabou por cair no erro da
repetição estética. Sinceramente, é difícil distinguir The Martian de uma
infindável quantidade de outras semelhantes narrativas. Aparte desse problema,
o filme é uma maravilhosa montra para o trabalho do cenógrafo, com a base
marciana a demonstrar os efeitos do ambiente e da improvisada sobrevivência do
protagonista, assim como momentos de grandiosidade espacial com a nave que
inclui uma interessante porção rotativa.
4. Eve
Stewart e Michael Standish por The Danish Girl
Da catástrofe cinematográfica que é o mais recente filme de
Tom Hooper, possivelmente o único elemento técnico que consegue escapar à
sufocante mediocridade de todo o projeto é a cenografia edificada pela veterana
Eve Stewart. Nas criações desta cenógrafa sempre existe uma formidável
utilização de texturas, de tal modo que os seus mundos primam por uma
tatilidade quase sensível a partir das imagens que conjuram, e The
Danish Girl, pelo menos a sua primeira metade é um perfeito exemplo
disso mesmo. A acrescentar ao seu fabuloso domínio de materiais e texturas
vem-se a acrescentar uma magnífica utilização de uma cuidada paleta cromática
inspirada nas pinturas do casal no centro de toda a narrativa. Nos ambientes
dinamarqueses existe uma sedutora simplicidade, mesclada com toques de
jubilante exuberância como as pinturas e esboços de Gerda ou uma infinidade de
tutus suspensos num teatro. Quando o filme transporta a sua narrativa para a
Paris dos anos 20, essa mesma simplicidade é substituída por uma explosiva orgia
de art déco e arte nova, que, apesar de nunca ser particularmente convincente
como um ambiente caracteristicamente parisiense, é uma fabulosa expressão de um
mundo distante da frieza dinamarquesa, onde o hedonismo luxuoso é a ordem do
dia. No final, o trabalho de Stewart é uma pérola reluzente num lamaçal de
mediocridade, mas isso não a impede de ser uma excelente candidata ao Óscar,
mesmo considerando que este é provavelmente um dos seus menos impressionantes
trabalhos nos últimos anos.
3. Adam
Stockhausen, Rena DeAngelo e Bernhard Henrich por Bridge of Spies
Apesar da construção do Muro de Berlim e a concretização das
delapidadas ruas da parte Leste de Berlim aquando do seu domínio soviético
serem as mais vistosas e memoráveis contribuições de Adam Stockhausen ao mais
recente filme de Steven Spielberg, eu diria que esses mesmos aspetos
representam a parte mais fraca ou menos louvável do seu trabalho em Bridge
of Spies. Enquanto os exteriores concebidos por este galardoado
cenógrafo são impressionantes, se bem que notoriamente ajudados por efeitos
visuais, a verdadeira glória do seu trabalho encontra-se nos interiores. Desde
uma visão ora acolhedora, ora fria e inóspita, dos conservadores anos 50 nos
EUA aos ambientes alemães, Stockhausen constrói um mundo credível mas, ao mesmo
tempo, pontuado com um toque de dramatismo que é quase como um piscar de olho à
audiência, tal como os convencionalismos classicistas que dominam os outros
aspetos técnicos do filme, Uso de mensagens nas paredes de uma prisão, por
exemplo, são um toque de humor gritado, mas não por isso menos glorioso.
Sinceramente, apenas pela sua orquestração de uma panóplia de diferentes
ambientes na Berlim dividida e em que cada escritório se demonstra como uma
parte de um puzzle de estratificações de poderes em conflito, Stockhausen
justificaria a sua presença nesta lista.
2. Jack
Fisk e Hamish Purdy por The Revenant
É verdade que quando pensamos em The Revenant, cenografia é
a última coisa que nos deverá passar pela cabeça, mas, para ser honesto, este
aspeto, juntamente com o seu som, são possivelmente as únicas categorias em que
eu consideraria colocar o filme de Alejandro González Iñarritu. Apesar do filme
ser dominado pela imponente paisagem natural, isso não implica que o lendário
cenógrafo Jack Fisk não tenha tido nas suas mãos um impressionante trabalho.
Desde a criação do acampamento atacado pelas forças nativas, a fugazes visões
de montanhas de ossadas e cabanas em chamas, passando por um imponente forte e
uma impressionante ruína, o mundo físico e espacial de The Revenant é edificado
de tal maneira que quase conseguimos sentir o odor da madeira húmida ou das
peles gélidas. A atenção ao detalhe e à veracidade histórica são um elemento de
louvar em The Revenant, e a cenografia não desaponta, sendo que o modo
como as construções humanas que vamos observando demonstram a sua fragilidade
face à imparável investida da natureza é possivelmente a melhor ideia que todo
o filme oferece. Na imagem de uma igreja, outrora majestosa mas agora reduzida
a um aglomerado de ruínas esquecidas pela civilização, Fisk consegue sugerir um
discurso artístico infinitamente mais complexo que qualquer pretensiosismo
conjurado pelo realizador desta obra tão adorada pelos Óscares.
1. Colin
Gibson e Lisa Thompson por Mad Max: Fury Road
Desde os interiores bizarros do reino
rochoso de Imortan Joe aos pesadelos sobre rodas em que o filme situa a grande
maioria da sua narrativa, Mad Max: Fury Road apresenta aqueles
que são, sem sombra de dúvida os mais espetaculares ambientes cénicos vistos no
cinema de 2015. Há um fabuloso barroquismo na visão pós-apocalíptica conjurada
por Colin Gibson e Lisa Thompson, com grotescas decorações a cobrirem todas as
superfícies, sem, no entanto, mostrarem qualquer noção contemporânea de
elegância ou harmonia visual. O feito técnico de criarem os veículos que
dominam o filme já seria suficiente para este par de cenógrafo e decoradora
arrecadarem um merecido Óscar, mas eles não se ficam por aí, construindo todos
os pormenores do mundo edificado por George Miller com uma precisão monumental,
em que a ferrugem é uma parte essencial da mise-en-scène, em que o calor do
metal aquecido pelo sol do deserto é quase sentido pela audiência, em que as
texturas de um interior são tão vividas que conseguimos imaginar as nossas mãos
a sentirem as suas imperfeições. Este é um trabalho de puro génio que pela sua
opulência talvez consiga mesmo capturar a atenção da Academia e vencer um óscar
que não pertence a mais nenhum dos nomeados aqui presentes, por muito admirável
que seja o seu trabalho.
PREVISÕES E DESEJOS:
Quem vai ganhar: Colin Gibson e Lisa Thompson
Quem eu quero que ganhe: Colin Gibson e Lisa Thompson
Quem merece ganhar: Colin Gibson e Lisa Thompson
5 escolhas alternativas que a Academia ignorou*:
- Judy Becker e Heather Loeffler por Carol
- Fiona Crombie e Alice Felton por Macbeth
- Mark Digby e Michelle Day por Ex Machina
- Alex DiGerlando, Kl Kenzie e Cynthia Anne Slagter por Chi-Raq
- Thomas E. Sanders, Jeffrey A. Melvin e Shane Vieau por Crimson Peak
*Esta seleção pessoal tem por base a lista de elegibilidade
da Academia e não a generalidade de 2015 enquanto ano cinematográfico.
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