quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Oscar Hopefuls, Taylor Sheridan por SICARIO




Sicario foi o primeiro filme com guião escrito por Taylor Sheridan, um ator que apenas recentemente se parece ter dedicado à escrita. Para uma estreia como argumentista, há que louvar a complexidade moral e ética que o seu texto consegue conjurar, ou pelo menos que o Denis Villeneuve consegue retirar do texto.

Essa, aliás, foi uma dúvida que mantive comigo desde que vi o filme, se o trabalho de Sheridan merece admiração ou se foi apenas o trabalho do realizador que possibilitou a emergência de surpreendentes complexidades e problemáticas na narrativa de Sicario e seu estudo de personagem. No final, decidi que, mesmo que as intenções de Sheridan estejam bastante distantes dos aspetos que eu mais aprecio no filme, o seu trabalho merecia louvor por possibilitar a construção de um dos melhores filmes do ano.




Em Sicario, seguimos a personagem de Kate Macer, interpretada por Emily Blunt no melhor trabalho da sua carreira, uma agente do FBI que se vê integrada numa equipa da CIA envolvida na guerra às drogas focada na luta contra os cartéis mexicanos. Com ela vamos descobrindo a sufocante teia de secretismos que formam a abordagem americana ao poder e influência dos cartéis, sendo que vamos também observando o machismo intrínseco a todas as interações dos membros da equipa para com Kate, nomeadamente o odioso, mas nojentamente descontraído, Matt Gaver (Josh Brolin) e o misterioso Alejandro Gillick (Benicio del Toro).

À medida que a narrativa se desenvolve, Kate vai constantemente investindo contra as obscuras forças de autoridade masculinas, tentando perceber o que realmente se está a passar no amoral mundo da luta contra os impérios das drogas, sendo que vai descobrindo, aos poucos os horrores desse mundo, assim como os horrores das ações americanas e o modo como tem sido manipulada durante toda a narrativa.




Em relação ao tratamento da sua protagonista, o guião de Sheridan lembra fortemente O Silêncio dos Inocentes, cuja protagonista, Claice Starling, é igualmente uma agente num mundo de domínio masculino, cujo maior adversário, mais ainda do que os monstros criminosos que sobre ela se abatem parece ser a sufocante patriarquia de todo o sistema em que se encontra. É claro que há algo a fortemente separar as duas personagens, Starling á uma heroína proactiva, enquanto Kate é um veículo da audiência, e longe de ser heroica e ativa ela funciona como uma testemunha aterrorizada de todos os horrores do filme que não se estendem somente à violência dos cartéis.

Parte do génio de todo o texto, devém do modo como encara as personagens da patriarquia que rodeiam Kate, nunca as julgando abertamente, mas deixando espaço à audiência para ver a negrura que se esconde por detrás do seu bravado, ativamente subvertendo as expectativas de uma audiência quando confrontada com o que é efetivamente um thriller de ação. Isto torna-se particularmente evidente quando o filme se torna numa narrativa de vingança a partir do momento em que abandona a perspetiva de Kate e se dedica a observar o sanguinário plano de Alejandro, o assassino titular.




Textualmente, há pouco de complexo ou verdadeiramente subversivo nesta porção do filme, mas a execução de Denis Villeneuve e todo a narrativa que a antecedem, levam a que esta clássica história de vingança, esta popular imagem do anti-herói contemporâneo, se revelem como tenebrosas expressões de amoralidade, aqui aprovada pelas forças americanas, que, na criação das suas demoníacas narrativas, são tão culpados da infernal situação do México como os cartéis. Sicario revela-se assim como uma surpreendente examinação de narrativas a que estamos perigosamente acostumados e que raramente questionamos, estando sempre na inocente presunção que sabemos distinguir heróis de vilões.


Toda esta brilhante subversão de narrativas populares no panorama atual do cinema americano podem ser inadvertidamente indicadas pelo texto de Sheridan, mas, independentemente, das suas intenções, volto a salientar quão brilhante é o resultado final. No panorama atual da Awards Season, uma nomeação para Melhor Argumento Original é uma possibilidade, especialmente depois do sucesso do filme entre os sindicatos de Hollywood, mas outros filmes, escritos por nomes bastante mais sonantes que o de Taylor Sheridan, poderão roubar o lugar a este merecedor, complicado e desafiador trabalho.



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