Malditos sejam os produtores que, eu
presumo, estiveram por detrás da decisão de separar o último livro da saga de
Harry Potter em 2 filmes, com a catastroficamente assustadora definição de
parte 1 e parte 2. Malditos sejam esses humanos, pois graças a eles
encontramo-nos num mundo em que os estúdios dividem adaptações literárias, não
por qualquer questão narrativa ou de complicada compressão de tempo, mas para
conseguirem espremer mais dinheiro das carteiras do seu, supostamente fiel,
público. E se tal praga já não deu resultados perfeitamente catastróficos e
completamente ridículos na sua flagrante sede monetária, como a separação de The Hobbit em três longos filmes, então
eu candidataria The Hunger Games:
Mockingjay – Part 1, como o mais horrendo ofensor desse crime tão popular
no cinema atual.
Eu não quero estar
apenas a pregar mais um prego no caixão que a crítica internacional já edificou
para este filme, mas há que dizer logo aquilo que é mais flagrantemente
problemático neste filme, ou seja o facto de que nada acontece. Para um filme
de intenções obviamente comerciais, e com uma duração que chega às duas horas,
penso ser bastante problemático nada acontecer e que o pouco que a história
iniciada com os dois filmes anteriores desta saga, é material que, com muita
sorte, seria apropriado para 30 bons minutos de cinema eficiente.
Não demorarei muito
tempo a explicar o enredo (o pouco que há), ou o que aconteceu antes (o filme
também não se preocupa com isto), sendo que a principal ação do filme é uma
campanha de propaganda que força Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) a
tornar-se um relutante símbolo de revolta e revolução nesse mundo distópico de
Panem, sendo que ela se encontra no anteriormente presumido destruído Distrito
13, governado pela fria e objetiva Alma Coin (Julianne Moore). A sua campanha
de propaganda é contraposta pelo Capitólio, cidade ditatorial que controla os
seus distritos vizinhos, estando o presidente Snow (Donald Sutherland) na
posição de chefe de estado e consequente vilão sádico e calculista do filme. Junte-se
a isto a figura de Peeta (Josh Hiutcherson), prisioneiro martirizado do
Capitólio e imagem de propaganda desses ditadores, assim como as filmagens e
discussões que se desenrolam à volta da propaganda do Distrito 13 e temos o
nosso filme. Talvez há que referir um ataque noturno e um resgate que marcam o
final do filme, mas isso seria dar os poucos detalhes que poderiam tornar a
experiência deste filme, algo minimamente agradável.
Os problemas provêm
principalmente do guião, que retira praticamente todos os pormenores que
poderiam desenvolver a vivência de Katniss no Distrito 13 e o modo como este funciona
no que parece ser uma visão distópica de uma sociedade comunista militarizada,
e que estica desnecessariamente discussões e cenas repetitivas e cujos temas
parecem ser completamente explorados na primeira intervenção entre Katniss e a
sua equipa de propaganda.
Não há maneira de
fugir ao desastre de proporções nucleares que é este guião, mesmo com um
realizador competente e um bom elenco, tudo no filme parece afundar-se com o
peso do seu horrível texto. Os visuais ainda conseguem chegar a alguns sucessos,
sendo a construção da fortaleza subterrânea que constitui o Distrito 13,
bastante promissora de um ponto de vista visual, especialmente quando filmado
por Francis Lawrence e Jo Willems. Os figurinos de Kurt e Bart também são
exemplares, apesar da profusão inescapável de cinzento. Os colarinhos justos e
decorados de Peeta nas cenas das suas entrevistas televisivas, são
particularmente boas escolhas, criando uma imagem de alguém prisioneiro até da
sua indumentária.
O elenco que antes
referi é, na sua maioria, competente e até bom, sendo Philip Seymour Hoffman e
Elizabeth Banks, os claros pontos altos do filme. Particularmente tristes dão
as prestações de Julianne Moore e Jennifer Lawrence. Moore não é má, de todo,
mas está presa a um guião que lhe pede apenas que recicle clichés de
personagens de líderes políticos já vistos milhares de vezes noutros filmes.
Mesmo assim consegue “vender” o seu grande discurso no final. O mesmo não se
pode dizer de Lawrence, cujo trabalho nos filmes anteriores tinha sido uma
brisa de ar fresco e que neste filme se afunda como tudo o resto. A inaptidão
da atriz para cativar a audiência com os conflitos interiores de Katniss são
óbvios para mim, e até o que deveria ser o seu momento alto, numa cena em que a
sua raiva explode num grito de fúria contra o Capitólio, a atriz parece fora do
seu elemento, tornando este momento supostamente impulsivo, numa leitura
demasiado acentuada de uma fala obviamente estudada.
Mesmo assim, há que
apontar, é interessante olhar para um filme com tão alta posição no box office
internacional cuja principal exploração e mensagem, se desenvolve à volta de
questões de propaganda política e de um mundo onde politicamente tudo se parece
separar em duas fações igualmente radicais, e cuja conclusão do seu conflito
parece ir acabar em nada a não ser absoluta destruição e sangue. Não que o
filme desenvolva muito estes temas, nem que a política do filme seja
particularmente complexa, mas por favor, deixem-me apreciar qualquer coisa
nestas duas horas de um aborrecimento inescapável e psicologias baratas,
comuns, e incrivelmente mal exploradas.
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